Editora: Europa Editora
Preço: € 9,90
Gênero: Poesia
Série: Espaços
Páginas: 83
Língua: português
EAN: 9791220117814
À Musa
Escrevo poesia para matar o Tempo.
Lanço no mar da escrita a minha vela
e rabisco no papel um grão esquecido
– é que, perdido na Noite, quero ser achado
no brilho dos teus olhos nunca visto.
Se insisto, se teimo no papel a pena
e a tinta azul ou negra, se não desisto
– é que, perdido na Noite, quero ser achado
no brilho dos teus olhos nunca visto.
Constanta (2005)
Nasci no Sul da minha terra, lá onde
crescem a esteva, a oliveira, o trigo
e a laranja redonda, ao sol, se alaranja.
Fui à guerra como o soldadinho do Pessoa:
esse mesmo, o menino da sua mãe,
só que tive sorte e não levei dois tiros.
Abundo de canudos universitários:
bacharel, licenciado, mestre e Doutor,
que não fizeram de mim um homem rico,
mas – que pena! – nem sequer um rico homem.
Ensinei a minha língua por decénios
com alguma competência, lá por longe,
e posso até decorar-me o pescoço com algo
muito mais do que uma simples comenda.
Andei por onde Ovídio triste chorou,
amaramente. Vi Delfos e os loureiros,
mas não falei com a Pítia. Amei
e fui talvez amado. Voltei a casa
cansado da viagem. Voltei a Lisboa,
da qual alguns antigos diziam antigamente:
Quem a não viu, não viu coisa boa,
e agora, espero aqui, onde a terra se acaba
e o mar começa, com algum pouco siso
e versos, o Céu, o Éden, o Paraíso.
António M. Ferro
Lisboa (2022)